É comum que em toda família haja um membro mais jovem que é visto por todos como o mais promissor dessa. Há sempre aquela discussão entre os tios onde cada um deposita confiança maior em um ou outro sobrinho, por exemplo. Geralmente isso é discutido não só em razão dos recursos materiais que facilitam o desenvolvimento humano da criança, mas a própria manifestação da inteligência que é evidente quando se acompanha de perto o crescimento dela. Quando o talento da criança é notório, até os vizinhos ou apenas os conhecidos da família a imaginam tornando-se uma grande pessoa. A rápida aprendizagem de leitura e escrita, a facilidade em manusear objetos e mexer em computadores, a espontaneidade ao tratar seus semelhantes são fatores que alimentam a expectativa da família de ver um pequeno membro tornando-se o mais exemplar do “clã”.
Acontece que essa expectativa muitas vezes é demolida rapidamente por contradições individuais ou tragédias exteriores ao sujeito. No caso da obra de Shakeaspere, por exemplo, Hamlet é um jovem culto, inteligente, com todo um caminho pela frente para construir uma história de conquistas e alegria. Todos que o conheciam davam como certa o seu sucesso como futuro rei. Contudo, essa projeção foi drasticamente alterada após sucessivas crises existenciais decorrida da perda do seu pai, finado rei da Dinamarca, morto pelo próprio irmão, numa obsessiva ganância por poder. Hamlet deixa de ser um jovem virtuoso de bom coração para transformar-se num sujeito rancoroso, vingativo e acomodado. Ele se deixa levar pelas maldades do mundo e acaba perdendo todas as suas boas virtudes.
Esse é um roteiro comum que rege a história de muitas famílias mundo a fora, até os dias de hoje. O individuo cresce até os seus 13 anos com bastante firmeza, mas acaba perdendo-se em meio à loucura e imprevisibilidade que a vida impõe. As constantes brigas entre os próprios pais dentro de casa, por exemplo, faz-se crescer traumas dentro do jovem que serão difíceis de superar. Os sucessivos problemas que aparecem causam impacto na autoestima dele. Não são todos que absorvem as reais circunstancias da vida com sabedoria e serenidade. Dependendo do tamanho do trauma, o jovem transforma-se numa pessoa completamente diferente do que fora até então. Essa transformação é tão grande que às vezes nem parece que ele é a mesma pessoa de antes. A absorção das maldades e mazelas do mundo corrói a alma profundamente, chegando-a destruir por dentro, deformando inteiramente a personalidade que até então estava definida no ser humano.
Ao chegar nesse estado decadente, fica comprovado que de nada adianta ser inteligente se essa inteligência não for amadurecida individualmente, e lapidada por aqueles que presenciam o desenvolvimento. É necessário que os pais saibam ensinar os seus filhos a usar essa inteligência para fazer o bem. Essa decaída que acontece na transição da adolescência a fase adulta é proveniente da falta de amadurecimento moral e pessoal. A não aceitação do processo natural da vida é atestado de infantilidade, de inocência perante os fatos reais do mundo. A tragédia de Hamlet mostra-nos o quanto pode ser fatal à alma a incorporação dos sentimentos de vingança, trapaça e enganação. Onde existe esse tipo de sentimento é sinal de que as coisas não acabarão bem, pra nenhum dos lados. No seio familiar isso só tem de causar conflito, discórdia e mal-estar, o que também trás péssimas consequências para a sociedade.

Comentários
Postar um comentário